04/02/2022
O Dia Mundial do Combate ao
Câncer, celebrado em 4 de fevereiro, busca orientar e educar sobre a doença, e
também convida à reflexão. Qual o sentido de conscientizar, se faltam meios
efetivos de diagnóstico, tratamento e cura para a maior parte da população
brasileira? O oncologista Fernando Medina, do Centro de Oncologia Campinas
(SP), entende que um dos principais problemas enfrentados pelos pacientes
oncológicos no Brasil é a falta de equidade entre o que é ofertado pela saúde
pública e pela rede privada.
Os pacientes oncológicos do Brasil vivenciam o abismo que separa
as realidades das redes privada e pública. Menos de 25% da população brasileira
têm acesso a planos de saúde médico-hospitalares. Todo restante depende do
Sistema Único de Saúde (SUS). Fernando Medina lembra que mesmo os moradores da
região de Campinas – que está entre as mais desenvolvidas do país e que oferece
melhores acessos à saúde – têm dificuldade para receber um atendimento
oncológico de qualidade.
“Há apenas três instituições públicas que atendem esses
pacientes na região de Campinas, uma população de quase 4 milhões de pessoas.
Infelizmente na nossa região o acesso ao diagnóstico e tratamento é muito ruim.
Muitos pacientes vão buscar radioterapia e quimioterapia em lugares distantes,
como Barretos ou Guarulhos. É inadmissível para o paciente que tem câncer, que
está enfraquecido pela própria doença, ter que viajar”, afirma o oncologista.
Medina mostra em números a realidade discrepante. “Um terço dos
casos de câncer pode ser prevenido, e mais um terço pode ser curado, desde que
exista acesso, tratamento e exames adequados e diagnóstico mais precoce
possível”, reforça. Cerca de 10 milhões de pessoas morrem anualmente no mundo
de câncer. “É mais do que aids, malária e tuberculose, juntos. Se a gente não
fizer nada, em 2030 a mortalidade vai para mais de 13 milhões de pessoas.
Aumentará quase um terço em oito anos”, alerta.
A origem dos problemas de equidade de tratamento está nas
próprias diretrizes que regem as orientações de detecção precoce – a arma mais
valiosa para cura do câncer. Há divergências de protocolo e diretrizes. “O
Ministério da Saúde, pelo viés de custo, adota diretrizes diferentes. Segundo a American
Cancer Society, a recomendação é fazer a mamografia depois dos 40
anos até os 70, anualmente. O Ministério da Saúde usa a diretriz de exames após
os 50 anos e a cada dois anos”, exemplifica.
Na escala seguinte da linha de diagnóstico do câncer, as
barreiras da rede pública também se erguem na comparação com o serviço privado.
Medina observa que muitos dos especialistas da linha de frente de atendimento
da saúde básica não recebem o devido treinamento para poder detectar
precocemente casos de câncer. “Os médicos não têm uma formação adequada de
prevenção, diagnóstico e tratamento de câncer.”
Esses profissionais, opina, deveriam ser treinados a detectar
mais rapidamente os sinais do câncer. “Hoje temos conhecimento de uma série de
sintomas indicativos do câncer. Por exemplo, ferida que não cicatriza há mais
de 15 dias, uma rouquidão por mais de 15 dias, qualquer nódulo pelo corpo,
dificuldade de engolir, alteração do hábito intestinal. São todos sinais
importantes que devem ser levados a sério a fim de possibilitar uma detecção
precoce do câncer”, diz Medina.
Já na fase de tratamento, a lacuna se torna ainda maior para os
pacientes oncológicos sem acesso a planos privados de saúde. Terapia
alvo-dirigida, imunoterapia e mapeamento genético, atualmente os principais
recursos de êxito na cura de muitos tipos de câncer, não são opção para os
pacientes do SUS. “Hoje temos tumores tratados exclusivamente com imunoterapia
e com terapia alvo, como por exemplo o melanoma e tumor renal, só que esses
tipos de tratamento não existem no SUS”.
Orientação
Apenas a equidade, que inclui orientação, facilidade de acesso
ao diagnóstico e de tratamento, será capaz de trazer prognósticos melhores à
grande maioria dos pacientes oncológicos do país, acredita Medina. “Na maioria
das vezes, o diagnóstico é tardio por falta de programas de prevenção adequados.
É preciso direcionar o público, de uma maneira geral, às ações de prevenção. E
permitir que todos tenham acesso às melhores técnicas e tratamentos, não
somente a pequena parcela que pode pagar um plano de saúde”.
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